quarta-feira, 29 de abril de 2015

X Congresso Ordinário do SITRAEMG: em debate, o PJe, o assédio moral, a longa jornada e outros fatores que causam o adoecimento do servidor


Postado em: 27/04/2015

Dentro do Painel de Saúde programado para a tarde de sábado, 25/04, no X Congresso Ordinário Estadual do SITRAEMG, no hotel Green Hill, em Juiz de Fora, foram abordados os temas “Assédio moral, jornada de trabalho e qualidade de vida” e “PJe e as doenças laborais”. Um dos palestrantes foi o psicólogo Arthur Lobato, que desenvolve projetos sobre saúde do trabalhador e traz em seu currículo um histórico de atuações nessa questão como parceiro de várias entidades sindicais, entre as quais o SITRAEMG, no período de 2008 a 2009. O outro foi o médico Rogério Dornelles, assessor do Fórum de Saúde do Trabalhador e pesquisador em colaboração com o Laboratório de Psicodinâmica do Trabalho. A mesa foi composta, ainda, pelo coordenador do Sindicato Célio Izidoro e pelos filiados Alexandre Brandi e Tâmisa Gonçalves.

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Da esquerda para a direita, o filiado Alexandre Brandi; o psicólogo Arthur Lobato; o coordenador do SITRAEMG Célio Izidoro; o médico Rogério Dornelles; e a filiada Tâmisa Gonçalves – Foto: Pedro Campos
“Assédio moral, jornada de trabalho e qualidade de vida”
Primeiro a falar, Lobato traçou um quadro estarrecedor da realidade da saúde do trabalhador brasileiro, em razão de uma busca sem medida do capital pela eficiência de seus funcionários para auferir lucros cada vez maiores. Segundo dados do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social), do ano de 2012, o Brasil tem mantido um uma média histórica de 700 mil acidentes de trabalho e doenças ocupacionais, por ano, com morte de 3 mil trabalhadores. Entre as causas mais comuns dos acidentes estão maquinário velho e desprotegido, tecnologia ultrapassada, mobiliário inadequado, ritmo acelerado, assédio moral, cobrança exagerada e desrespeito a diversos direitos. Essa situação de insegurança se alia às novas exigências do mercado de trabalho cujo objetivo é resolver as coisas rapidez, com jornadas cada vez mais alongadas e invadindo a vida privada, e o estabelecimento de metas visando resultados inalcançáveis, levando o trabalhador (da iniciativa privada ou do setor público) à exaustão. Ao final do dia, o sentimento frustrado de que não fez tudo o que devia. O resultado disso é o desgaste físico, mental e emocional e as doenças daí decorrentes.
As novas exigências do mercado de trabalho criam um ambiente de competitividade que só faz adoecer o trabalhador e ainda o coloca suscetível a uma prática também cada vez mais presente nas organizações: o assédio moral, que Lobato define como “uma conduta abusiva, intencional, frequente e repetida, que ocorre no ambiente de trabalho, e que visa diminuir, vexar, constranger, desqualificar e demolir psiquicamente um indivíduo, ou um grupo, degradando as condições de trabalho, atingindo sua dignidade e colocando em risco sua integridade pessoal e profissional”. Consequências do assédio moral: queda de produção; licenças; acúmulo de trabalho não realizado; tarefas múltiplas; esgotamento; mais assédio, mais licenças, mais acúmulo de trabalho, mais assédio; depressão; mudança de setor; vítima chega estigmatizada em novo setor; incapacidade laborativa.
Mas o assédio, adverte o palestrante, é crime, e somente a prevenção, o debate e o esclarecimento podem cortar este mal pela raiz. E todas essas ameaças à saúde do trabalhador são consequência da organização dos locais de trabalho. Para amparar o trabalhador nesse quesito, ele sugere a criação do plantão sindical de combate ao assédio moral e para a saúde do trabalhador. Aproveitando a oportunidade, o coordenador geral do SITRAEMG Alexandre Magnus informou que o psicólogo já está contratado pelo Sindicato desde o dia 1º de abril.
“PJe e as doenças laborais”
O médico Rogério Dornelles fez sua exposição com base em dados de pesquisa realizada por ele e sua equipe no Sintrajufe/RS, com os servidores do Judiciário Federal do Rio Grande do Sul, no período de setembro de 2011 a janeiro de 2012. Até então, já havia sido implantado o sistema de processos judiciais naquele estado somente da Justiça Federal. E o que a pesquisa revela é que exatamente nessas unidades apareceram os maiores índices de insatisfação e adoecimento dos servidores. Nos olhos, dor e ardência, ressecamento, cansaço; dores no pescoço, costas ombros, braços e pernas; distúrbios psíquicos; uso de medicamentos anti-inflamatórios, calmantes, antidepressivos. Em todos esses indicadores, a Justiça Federal apresentou sempre os percentuais mais altos. A pesquisa também revelou, como tendência em todos os tribunais, que os servidores se sentem discriminados mais por se afastarem para tratamento de saúde do que por motivos em isso ocorre: cor, credo, etnia orientação social.
O palestrante também falou sobre dados revelados por reportagem do O Globo, de outubro de 2013, sobre a implantação do PJe no RJ. Segundo a reportagem, o sistema eletrônico só funcionou, sem interrupção, 2 dias em outubro, segundo TRT1; o prazo médio para a tramitação de uma ação no RJ subiu de 222 dias para 380 dias naquele ano, significando aumento de 71%; em outubro/13, aumentou 0,5% no ingresso de ações; o juiz Saulo José Cassari Bahia destacou que a receptividade do Pje tem sido boa nos  outros 24 TRTs. Ele também apresentou dados de levantamento feito em 2013 pelo Sintrajufe/RS que detectou o seguinte: o sistema é lento, ocorrendo muitas quedas na internet; ausência de critérios para entrada de documentos; ineficiência do sistema de pesquisa e busca; ineficiência ou ausência do controle de prazos; impossibilidade de fazer o cadastro de outros interessados no processo; suporte ineficaz: treinamento insuficiente, as modificações não são notificadas, etc.; ambiência ruim.; redução de servidores. Com toda essa ineficiência do sistema, a intenção do TRT/RS para 2014 ainda era: extinguir secretarias = 8 varas  p/ 2 secretarias; reduzir atividades de apoio, mais assessoria ao Juiz; reduzir de 3 a 4 servidores por vara. Quer dizer: sistema confuso, mais serviço para os poucos servidores restantes.
Por traz, o Banco Mundial
Toda essa pressão feita sobre os servidores, segundo o palestrante, tem por traz a defesa do jogo de interesses do capital internacional, em manobra arquitetada pelo Banco Mundial, através do Documento 319, de 1996, que traz diversas recomendações materializadas na Emenda Constitucional nº 45, em vigor desde 2004, dentre as quais aprimorar a qualidade e eficiência da justiça, fomentando um ambiente propício ao comércio, financiamento e investimentos; solver os conflitos e organizar as relações sociais para oferecer à  economia de mercado demanda um sistema jurídico eficaz para governos e setor privado.
Na avaliação do palestrante, a informatização agravou os já existentes problemas de organização e relações de trabalho no Judiciário Federal; os indicadores de saúde involuiram onde foi implementado o processo eletrônico; há um maior controle e determinação de metas inalcançáveis; aumentou a quantidade de trabalho; e instalou-se a cultura de excelência impregnada da ideia de perfeição e de superioridade, o afrouxamento de princípios éticos e o sentimento de onipotência, do desrespeito com os subordinados e com seus próprios limites, provocando levando os trabalhadores doença mental e até ao suicídio.
E a continuar essa situação, alertou, as perspectivas são as piores: a piora das condições de trabalho afetarão a saúde mental, osteomuscular, ocular e outras; cargos concentrados em Juízes, nos de formação jurídica e informática; padronização e intensificação do trabalho, fazendo do juiz um operador e não um pensador(encaminha ao nível superior da hierarquia); as decisões judiciais serão geradas nos níveis superiores da hierarquia(ciclo); o salário será desproporcionalmente maior para os de cima na hierarquia.
Como solução para essa realidade, ele aponta a adoção das seguintes medidas: proteção individual da saúde; capacitação adequada; melhora da ambiência, hardware e software; debate com a sociedade sobre o Judiciário e seu papel na democracia; aprofundar o debate sobre a organização do trabalho, inclusive suas formas de premiação e remuneração; redução da jornada de trabalho; intransigente defesa da saúde; instituir comissão de saúde.
Depoimento emocionado sobre assédio moral
Não diferente das outras atividades do X Congresso Ordinário Estadual do SITRAEMG, foi dado amplo espaço para os debates também após as palestras do painel de saúde. Apesar de adentrarem a noite, o plenário permanecia lotado. “Vão sortear brindes ao final das palestras?”, brincou Arthur Lobato. Os filiados elogiaram bastante a elucidação trazida pelos dois expositores e sugeriram a realização de pesquisa semelhante à do Rio Grande do Sul também em Minas e até em âmbito nacional, para se ter um quadro atual da implantação do PJe e do adoecimento dos servidores em todos os tribunais. Além disso, apresentaram diversas queixas, tais como excesso de trabalho, em consequência do aumento da demanda de processos com a redução do quadro de servidores; extensão do trabalho para além da jornada, com a determinação de tarefas via meios de comunicação disponibilizados pela internet (e-mail) e telefones celulares (WhatsAPP); abusos de poder dos magistrados e chefias, com a ocorrência de muitos casos de assédio moral.
Um dos momentos que chamaram mais a atenção dos presentes foi quando o coordenador regional do SITRAEMG Henrique Olegário Pacheco deu um depoimento emocionado sobre o assédio moral sofrido por ele na Justiça do Trabalho. Servidor licenciado da JT, ele narrou o drama viveu ao longo de anos, em perseguição iniciada por um juiz com quem trabalhou. Ele disse que gostava muito de trabalhar na Justiça do Trabalho. Com a habilidade que foi adquirindo, logo passou a ser designado para colocar em ordem varas do trabalho que eram consideradas problemas pela administração do TRT. Ele aceitava com muita alegria a tarefa, pois além da satisfação com o serviço gostava de conhecer novos colegas. Começou a perdê-la quando encontrou um juiz que não viu com bons olhos sua presença na VT da qual era titular. O magistrado o recebeu de maneira agressiva. Impedido de desenvolver o trabalho da forma necessária e como sempre fazia, Olegário pediu para ser transferido para outra vara. Só que o juiz, já com o intento de persegui-lo, instruiu o juiz da nova VT para a qual ele se transferiria, com acusações absurdas e inverídicas a seu respeito. De repente, seu caminho foi ficando “minado” dentro da instituição, sem que nada tivesse feito para merecer isso. Ele tentava explicar aos seus superiores, mas não lhe davam crédito. Preferiam acreditar que ele estava com algum desequilíbrio e chagaram a diagnosticar um quadro de esquizofrenia. Foram muitas as licenças e voltas ao trabalho. Posteriormente, porém, chegaram à conclusão de que ele estava curado. Ele voltou a trabalhar, mas a motivação não era a mesma e ele decidiu se licenciar novamente.
Ouvindo atentamente o relato do servidor, o médico Rogério Dornelles frisou que toda essa perseguição teve origem na inveja e no ciúme do magistrado, e fez uma observação a respeito do diagnóstico de esquizofrenia. Essa doença, informou ele, é incurável. Seria o do servidor Henrique Olegário o primeiro caso de cura?

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